A mudança de hábitos coletiva pode refletir na eficácia dos métodos de emagrecimento indicados às crianças
Camila Santos – O Estado de S.Paulo
Com o avanço dos recursos tecnológicos, que permitem cada vez mais comodidade aos usuários, o gasto energético ao realizar atividades diárias tende a diminuir, dando lugar ao sedentarismo e, consequentemente, ao sobrepeso. Hipertensão, diabetes, colesterol elevado, doenças cardíacas e depressão. Estas são algumas das complicações geradas em decorrência do excesso de gordura corporal, causando grande impacto no cotidiano daqueles que as têm. De acordo com pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), realizada pelo Ministério da Saúde, mais da metade da população brasileira, 52,5%, está acima do peso. Os dados referentes ao ano de 2014 apontam também que, deste número, 17,9% são indivíduos obesos.
Segundo o psicólogo Luiz Ricardo Gonzaga, as pessoas que se encontram na fase adulta podem utilizar a alimentação como estratégia compensatória para justificar emocionalmente alguns comportamentos característicos. “Emagrecer exige mais autocontrole do próprio indivíduo em comparação ao ambiente, pois cada um decide o que comer ou não em determinado momento independentemente das consequências associadas”, salienta.
Entretanto, este quadro preocupante não se restringe aos adultos. O levantamento divulgado pela revista científica ‘The Lancet’ em 2014 mostra que, de 1980 a 2013, a obesidade e o sobrepeso aumentaram 47,1% entre as crianças. O profissional frisa que esta faixa etária torna-se mais vulnerável ao ser atingida por inúmeras ferramentas de publicidade das empresas alimentícias, que vinculam produtos a personagens de destaque, como super-heróis, por exemplo. “Esse pareamento constante faz com que a criança, às vezes, sem o conhecimento do valor calórico do alimento, se torne condicionada a um tipo específico”, afirma.
Gonzaga explica que os pais podem oferecer quantidades exageradas de comida aos filhos como estratégia de compensação à falta de carinho ou atenção. “Deve-se avaliar a função deste hábito de excesso alimentar, observando os antecedentes deste e as consequências associadas a ele.” Para o psicólogo, o núcleo familiar representa o modelo a ser seguido pelos mais jovens tanto no processo educacional como na aquisição de um determinado estilo de vida. “A congruência entre o comportamento dos pais, isto é, o que eles fazem na frente dos filhos, e o que eles dizem é um ponto importante neste processo de maturação psíquica.”
Por outro lado, o ganho de gordura pode estar relacionado ao desequilíbrio emocional, como observa o neuropsicólogo Antônio Serafim, colaborador do departamento de psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP): “Talvez a criança tenha uma autoimagem distorcida ou muito aquém do real e se sinta diferente, rejeitada, insegura, podendo desenvolver um padrão alimentar irregular e até compulsivo.” Neste contexto, os pais devem estar atentos aos fatores que desencadeiam o problema para, em seguida, partirem em busca de soluções. “É necessário que haja compreensão, se estabeleça um vínculo de confiança e cuidado, sem criar a superproteção”, afirma o neuropsicólogo.
Tratamento. Se a questão da obesidade infantil preocupa os familiares, as alterações que poderão revertê-la também devem ter a participação daqueles que fazem parte do ambiente de vivência da criança. Ou seja, a mudança de padrões deve ser aplicada em conjunto. “Não é só a alimentação que é levada em conta, mas tudo o que a pessoa faz no dia a dia”, esclarece a endocrinologista Viviane Oliveira.
Apesar disto, a endocrinologista afirma que, muitas vezes, os pais levam os filhos aos consultórios com a intenção de que emagreçam, porém se esquecem da importância das próprias atitudes. “Os responsáveis relutam a entender que aquela situação foi criada por eles mesmos. Afinal, quem leva a comida para casa é quem faz a compra do mês.” Esta dificuldade ocorre porque é difícil aceitar que práticas aparentemente inofensivas possam ter reflexos destrutivos.
O emagrecimento também é complexo por envolver acompanhamento nutricional e psicológico, combinados à execução de atividades físicas desenvolvidas conforme o perfil da criança. “É uma tarefa multidisciplinar, com certeza. Já que as os obesos possuem maior tendência à depressão por causa do excesso de consumo de açúcares”, comenta Viviane. Os quilinhos a mais passam a ser motivo de desconforto e podem prejudicar o desenvolvimento escolar, inclusive: “As aulas de educação física passam a ser um tormento e a criança se sente diferente dos colegas”, destaca.
Quando se trata dos pequenos, a perda de peso deve estar associada a brincadeiras e elementos lúdicos, para que não haja um bloqueio por se tratar de uma transformação que deve acontecer gradativamente. “Em um primeiro momento, faço uma entrevista para avaliar o Índice de Massa Corporal (IMC) do paciente e estimulo que os alimentos prejudiciais sejam substituídos de forma criativa.”